quinta-feira, 14 de julho de 2011

capítulo 1: no princípio, era o blues...




O rock, enquanto um estilo único que "abraça" todas as suas subvertentes, pode ser, certamente, considerado riquíssimo em termos de influências. Na verdade, tudo o que foi produzido de rock nestas quase sete décadas de existência sofreu influência direta de outros gêneros que, a princípio, eram totalmente dispersos. No subgênero progressivo, por exemplo, é mais que óbvia a interação do rock já existente à época com a música clássica, principalmente aquela do período barroco; as composições de Elvis Presley (tido ainda hoje como o Rei do Rock), Little Richards, Jerry Lee Lewis e Chuck Berry eram calcadas firmemente no que ficou conhecido como rockabilly; o rock psicodélico, característico de bandas como o Pink Floyd, em sua primeira fase, The Doors, Beach Boys e The Who, era fortemente integrado ao soul. O próprio rock, de alguma maneira, se "reciclou" várias vezes, como veremos em capítulos futuros. Mas nenhum destes estilos foi mais característico no estilo que hoje conhecemos como rock, de um âmbito mais generalizado, do que o blues.

O blues teve suas origens nos cantos dos negros que trabalhavam como escravos nas fazendas de algodão do sul dos EUA, ainda no século XVIII. Após o fim da Guerra de Secessão e a vitória dos Estados do Norte, formando uma nação única e soberana no que hoje conhecemos como a Costa Leste dos EUA, no final do século XIX, o blues tomou contornos mais cult, passando a expressar o valor pela cultura africana dos antepassados trazidos à América nos navios negreiros, em detrimento do canto de repressão que era característica marcante do ritmo anos antes, dado o sofrimento de trabalhar todo o dia no campo.

Em meados da década de 1920, o blues tomou, finalmente, uma forma mais profissional. Os cantores pioneiros do estilo, à época, incluíam Charley Patton, Son House, Willie Brown, Leroy Carr, Bo Carter, Sylvester Weaver, Blind Willie Johnson e Tommy Johnson. As músicas da época ainda eram, em sua maioria, os cânticos campestres de anos antes, de modo que, não raro, os diversos grupos tinham várias composições em comum. Somente na década de 1930 surgiu um verdadeiro blues boy, tido ainda hoje por muitos como o melhor cantor de blues de todos os tempos.

Robert Leroy Johnson (1911 (?) - 1938)
Robert Leroy Johnson nasceu no Mississippi. Não se sabe ao certo quando ou onde ele nasceu exatamente. Na verdade, toda a sua vida é cercada de muitos mitos, muitas vezes impossíveis de serem diferenciados do que, de fato, ocorreu. Sabe-se apenas que Johnson tem apenas 29 músicas, gravadas nos anos de 1936 e 1937. Um mito que se tornou muito famoso da vida de Johnson faz alusão a um encontro dele com o diabo, na encruzilhada das Highways 61 e 49. Diz-se que lá ele vendeu sua alma, em troca da proeza em tocar guitarra. A lenda tornou-se famosa por Son House, uma das maiores influências de Johnson no blues. Segundo vários relatos, ele tocava de costas para a plateia - alguns dizem que isso era porque, ao tocar, seus olhos ficavam em chamas, possuídos pelo demônio. Johnson morreu, na versão mais aceita, após beber um copo de whisky, envenenado pelo dono do bar, que havia visto Johnson flertar sua mulher. Sua obra foi influência direta na música de mitos como Eric Clapton, Muddy Waters, The Rolling Stones e Bob Dylan.

Já na década de 1940, bandas como Sonny Boy Williamson e Big Bill Broonzy eram bastante conhecidas no meio blues. Foi a partir também da década de 1940 que o blues deixou de ser exclusivamente do delta do rio Mississippi e foi levado para outras cidades americanas, fazendo assim com que o estilo se subdividisse em várias vertentes, cada qual sob a tutela de uma cidade diferente. Destaco, entre estes, o blues de Detroit (de onde veio John Lee Hooker), o blues da cidade do Kansas, o blues de Louisiana (surgiu de lá Robert Pete Williams e Lightnin' Slim), o blues de Memphis (Furry Lewis é o principal expoente) e o blues de Piedmont.

Muddy Waters (1915 - 1983)
Entre todos estes, é interessante destacar dois, em especial: o blues de St. Louis e o blues de Chicago. Foi destas duas cidades que saíram nomes como BB King, Buddy Guy, Chuck Berry, Howlin' Wolf, Albert King e Muddy Waters, por exemplo. O primeiro deles caracteriza-se por uma levada mais suave que o rockabilly (também conhecido por rock 'n roll, embora alguns prefiram denotá-los separadamente), além de ter como base o piano, e não tanto o baixo, como nas demais vertentes. Já o blues da cidade de Chicago utilizava mais instrumentos elétricos que os demais, incorporando assim uma sonoridade mais robusta e moderna, nunca antes vista na música norte-americana.

Um show, em especial, ficaria marcado na história: a apresentação de Muddy Waters em Londres, no início da década de 1950. Certamente, foi este o marco inicial do blues em terras europeias, movimento que ainda hoje é conhecido como European blues. Talvez tenha sido este o pontapé inicial também para a criação um dos ritmos mais cativantes de toda a história, inspiração desse blog e desta série em capítulos que se inicia hoje. Um dos principais responsáveis por isso é eleito ainda hoje como um dos guitarristas mais virtuosos de todos os tempos, mas a real popularização do rock veio com um certo quarteto da cidade inglesa de Liverpool e um ex-caminhoneiro do Tennesee. Mas isso é história para o próximo capítulo...