segunda-feira, 28 de março de 2011

fatos e mitos sobre fukushima




Creio não ser novidade para ninguém os fatos ocorridos no Japão após o terremoto ocorrido às 14h43 (horário local, 2h43 do horário de Brasília) do dia 11/03 passado. Mesmo tendo ocorrido a quase 400 km de Tóquio, a aproximadamente 24 km de profundidade, a capital japonesa tremeu com o abalo sísmico, de 8.9 graus na escala Richter - o maior da história japonesa e o quarto (ou quinto, as informações são díspares com relação a isso) na história desde a medição de tais fenômenos no planeta. Mas, apesar da tragédia, o que mais preocupa atualmente as pessoas ao redor do mundo são as sucessivas explosões ocorridas em 4 dos 7 reatores nucleares da usina de Fukushima Daiichi, situada 250 km ao norte de Tóquio. Porém, muito do que se diz não passa de mera especulação/sensacionalismo, e o objetivo deste post é, baseado em conhecimentos por mim adquiridos, elucidar o que é verdade e o que não é.

Antes de tudo, creio ser necessário um pequeno parênteses: saber como funciona uma usina produtora de energia elétrica por fusão nuclear, como a usina japonesa. Uma usina como Fukushima tem imensos tanques cheios com água e barras de elementos radioativos, em especial o urânio-235 e o plutônio-239. Esses elementos são submetidos a pequenas fusões, controladas por outros elementos químicos e monitoradas 24h. As fusões liberam energia em forma de calor, e a água dos reatores evapora. O vapor liberado pelos reatores gira um enorme dínamo que, assim como nas usinas hidrelétricas, é rotacionado, gerando a energia elétrica propriamente dita. O vapor d'água é então liberado no ar, sem nenhum composto radioativo, e a energia segue por fios até abastecer as cidades.

O abalo comprometeu o sistema de resfriamento dos reatores, gerando um super aquecimento. Como o calor excessivo não escapava de forma correta, a pressão interna dos reatores aumentou demais e acarretou uma explosão. As paredes do reatores são extremamente resistentes, já que têm cerca de um metro de espessura em certos pontos estratégicos, e não foram danificadas ao ponto de ocorrer um desastre ainda maior. A nuvem de radiação rapidamente espalhou-se pelas vizinhanças de Fukushima, e os moradores em um raio de 20 km de distância foram rapidamente removidos de suas casas.

Especulou-se muito sobre essa radiação chegar até a Europa. Balela: a radiação muito provavelmente não afetará sequer Tóquio, e certamente não afetará a níveis considerados perigosos. Tanto é verdade que a população que ficou em um raio de 20 a 30 km da usina sequer foi retirada do local, tendo sido orientados a permanecer em casa com portas e janelas fechadas. Saliento, mais uma vez: Tóquio fica a 250 km de Fukushima; a costa oeste norte americana, onde moradores já compram, aos montes, pílulas capazes de anular os efeitos das radiações, fica a aproximadamente 12.000 km, mais do dobro da distância entre o monte Roraima, ponto mais setentrional do território brasileiro, ao arroio Chuí, o extremo sul de nosso país.

Outro mito: Fukushima passar a ser o maior acidente nuclear da história, superando a famosa explosão da usina de Chernobyl, na antiga União Soviética (hoje parte do território ucraniano). O vazamento radioativo, ocorrido em 26 de abril de 1986 e que evacuou a cidade vizinha de Pripyat, foi considerado de nível 7, e o de Fukushima, nível 6. (Na verdade, ainda há um vazamento considerado "intermediário", em Three Mile Island, Pensylvania, EUA, ocorrido em 28 de março de 1979.) A considerar que o desastre de Chernobyl foi um fator decisivo nas discussões acerca do uso da energia nuclear e os riscos aos quais estamos expostos, seria mais que óbvio que o acidente soviético seria bem mais relevante. A explosão ocorreu em razão de testes mal sucedidos, ainda durante o processo de construção da usina, não estando, assim, plenamente dentro dos níveis de segurança da época. Estima-se que a nuvem, cuja radiação supera em 400 vezes a Little Boy (bomba lançada sobre Hiroshima na Segunda Guerra Mundial), alcançou a Inglaterra e a Escandinávia, a oeste, e boa parte do território da União Soviética, a leste, sem, no entanto, ser alta o suficiente para causar qualquer dano aos seres humanos.

Protestos ao redor do mundo

Diversas organizações em favor do meio ambiente e dos direitos humanos têm feito passeatas e protestos ao redor do mundo, no intuito de que boa parte das 210 usinas e dos 440 reatores nucleares ainda em funcionamento ao redor do mundo fossem desativadas apara que não acontecesse, mais uma vez, tal desastre. Os que defendem as usinas afirmam que a segurança delas é tão grande que isso é extremamente improvável que aconteça novamente, ainda mais se contarmos com o fato de que o desastre em Fukushima deveu-se a um abalo fortíssimo - seria como desativar todos os aviões comerciais só porque um deles caiu por uma pane qualquer. Além do mais, a produção de energia elétrica por meio da fissão/fusão nuclear é extremamente significativa (cerca de 16% da energia elétrica consumida no planeta, cerca de 372 GW, é produzida de tal forma), sendo necessária a produção por outros meios, que são pouco eficazes, ou muito prejudiciais à natureza, ou tão perigosos quanto o modo de produção por fusão.

Para saber mais detalhes sobre o funcionamento de uma usina nuclear, acesse a questão das malvinas aqui. Abaixo, uma animação detalhada sobre tal método de produção de energia elétrica.

Atualização por correção: dia 30 de março de 2011

A usina nuclear de Fukushima Daiichi, assim como todas as usinas termonucleares ativas atualmente, funcionam a partir da fissão nuclear, e não da fusão nuclear, como dito anteriormente. A diferença básica entre os dois tipos de reação nuclear é que em uma reação do tipo fissão nuclear, o núcleo do átomo subdivide-se em dois ou mais núcleos de átomos menores. Tal como previsto pelo modelo atômico quântico de Niels Bohr, a reação desencadearia a perda de energia do sistema (no caso, em forma de calor, que irradiaria e aqueceria o tanque). O modelo de fusão nuclear prevê justamente o contrário: dois núcleos de deutério (configuração particular do hidrogênio, de massa atômica igual a dois) seriam aquecidos em um tanque e sofreriam a fusão para formar um novo átomo, de hélio (m.a. igual a quatro). A diferença energética entre os dois núcleos de deutério e o de hélio será emitida na forma de energia térmica, suficiente para manter o estado plasmático e com sobra de grande quantidade, a ser convertida em energia útil. Cientistas do Japão e da União Europeia, do projeto Iter, estudam um modo de viabilizar a produção de energia elétrica também deste modo.

Agradecimentos à Camila por me alertar o erro. ;D